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segunda-feira, 26 de março de 2012

poetas do Realismo português

Antero de Quental

Antero Tarquíinio de Quental nasceu na ilha Ponta Delgada, Açores, em 1842. Cursou Direito na Universidade de Coimbra. Viajou por Paris, Estados Unidos e Canadá e fixou-se em Lisboa. Participou ativamente da Questão Coimbrã e das Conferências do Cassino Lisbonense, nas quais adquiriu vários amigos, como, por exemplo, Eça de Queirós. Deprimido, suicidou-se em sua terra natal em 1891. Obras: Raios de extinta luz, Odes modernas, Primaveras românticas, sonetos, prosas e cartas.

A produção poética de Antero de Quental reflete suas angústias existenciais e seus conflitos (que o levam ao suicídio), além de mostrar temática revolucionária.

Foi um grande sonetista, apresentando momentos iluminados, otimistas e outros de extremo pessimismo, tomando como inspiração o filósofo Schopenhauer.

Tese e antítese

Não sei o que vale a nova idéia,

Quando a vejo nas ruas desgrenhada,

Torva no aspecto, à luz da barricada,

Como bacante após lúbrica ceia!

Sanguinolento o olhar se lhe incendeia...

Aspira fumo e fogo embriagada...

A deusa de alma vasta e sossegada

Ei-la presa das fúrias de Medeia!

Um século irritado e truculento

Chama à epilepsia pensamento,

Verbo ao estampido de pelouro e obus...

Mas a idéia é num mundo inalterável,

Num cristalino céu, que vive estável...

Tu, pensamento, não és fogo, és luz!

Vocabulário:

desgrenhada: descabelada

barricada: barreira feita para se proteger em uma batalha

bacante: discípula de Baco, deus do vinho e dos prazeres carnais

lúbrica: sensual, cheia de luxúria

Medeia (mitologia grega): mata os próprios filhos para atingir seu ex-marido, Jasão

pelouro: arma

obus: arma, peça de artilharia

Neste soneto bastante filosófico, podemos observar o lado luminoso e otimista de Antero de Quental. O eu lírico defende o uso do pensamento lógico, que é luz, sabedoria.

Por outro lado, condena as ideias insanas, cheias de fúria, inclusive as comparando a Medeia, que louca matou seus filhos, ou mesmo a uma mulher embriagada.

Veja como o poema trata do cotidiano, referindo-se a “um século irritado e truculento”, que angustiava seus intelectuais.

O convertido

Entre os filhos dum século maldito

Tomei também lugar na ímpia mesa,

Onde, sob o folgar, geme a tristeza

Duma ânsia impotente de infinito.

Como os outros, cuspi no altar avito

Um rir feito de fel e de impureza…

Mas um dia abalou-se-me a firmeza,

Deu-me um rebate o coração contrito!

Erma, cheia de tédio e de quebranto,

Rompendo os diques ao represo pranto,

Virou-se para Deus minha alma triste!

Amortalhei na Fé o pensamento,

E achei a paz na inércia e esquecimento…

Só me falta saber se Deus existe!

Vocabulário:

ímpia: impura

avito: que vem dos antepassados

contrito: em contrição, arrependido

erma: longínqua

amortalhar: colocar uma mortalha, uma roupa de morte, enterrar

Neste outro soneto, temos um exemplo do lado mais pessimista e melancólico do poeta. O eu lírico, após ter renegado a religião, parece que quer se converter, pois não confia mais na razão: “Amortalhei na Fé o pensamento”, mas também tem dúvidas sobre a existência de Deus.

Cesário Verde

José Joaquim Cesário Verde nasceu em Lisboa em 1855. Chegou a matricular-se no curso de Letras da Universidade de Lisboa, mas desistiu para trabalhar com seu pai em uma loja de ferragens. Publicou algumas poesias no Diário de notícias, no Diário da tarde, no Ocidente, entre outros. Morreu de tuberculose com apenas 31 anos em 1886. Sua obra foi publicada postumamente em 1887, sendo composta por um único livro: O livro de Cesário Verde. Além de Camões, é considerado como uma forte influência na obra de Fernando Pessoa.

Veja um trecho do belo poema Sentimento de um ocidental, no qual o poeta faz um retrato lírico e realista da cidade de Lisboa. Andando pelas ruas desde o anoitecer até a madrugada, o eu lírico descreve a realidade de uma cidade já marcada pela modernidade.

Cesário Verde é conhecido por sua poesia do cotidiano, na qual situações comuns e banais são poetizadas. Além disso, seu realismo é expressionista, cheio de emoção.

Ao Gás

E saio. A noite pesa, esmaga. Nos

Passeios de lajedo arrastam-se as impuras.

Ó moles hospitais! Sai das embocaduras

Um sopro que arrepia os ombros quase nus.

Cercam-me as lojas, tépidas. Eu penso

Ver círios laterais, ver filas de capelas,

Com santos e fiéis, andores, ramos, velas,

Em uma catedral de um comprimento imenso.

As burguesinhas do Catolicismo

Resvalam pelo chão minado pelos canos;

E lembram-me, ao chorar doente dos pianos,

As freiras que os jejuns matavam de histerismo.

Num cutileiro, de avental, ao torno,

Um forjador maneja um malho, rubramente;

E de uma padaria exala-se, inda quente,

Um cheiro salutar e honesto a pão no forno.

E eu que medito um livro que exacerbe,

Quisera que o real e a análise mo dessem;

Casas de confecções e modas resplandecem;

Pelas vitrines olha um ratoneiro imberbe.

Vocabulário:

impuras: pode-se inferir que são prostitutas

tépidas: quentes

resvalar: se arrastar, sujar-se

cutileiro: loja de ferramentas

forjador: espécie de ferreiro

malho: martelo, instrumento do ferreiro

exacerbar: ultrapassar limites

ratoneiro: imberbe: ladrão jovem,menino

Veja como o poeta descreve as ruas de forma grotesca, mas real, em um ambiente urbano e moderno. Ele critica a burguesia e o clero, envolvendo as “burguesinhas” e as freiras em um ambiente degradante e doentio. Observe como as imagens, sons e cheiros se misturam, despertando vários sentidos.


Guerra Junqueiro

Abílio Manuel de Guerra Junqueiro nasceu em 1850 em Freixo da Espada, em Trás-os-Montes. Formou-se em Direito pela Universidade de Coimbra, trabalhando posteriormente como funcionário público e deputado. Aderiu aos ideais republicanos em 1891 após o fatídico Ultimatum inglês, no qual a Inglaterra exigia a posse de diversas colônias portuguesas. O espiritualismo e o idealismo tornaram-se marcas de seu estilo. Obras: A Morte de D. João (1874), A musa em férias (1879), A velhice do padre eterno (1885), Finis Patriae (1890), Os simples (1892), Pátria (1896), Oração ao pão (1903), Oração à luz (1904), Poesias dispersas (1920).

A seguir, um fragmento de Os simples:

Regresso ao lar

Ai, há quantos anos que eu parti chorando

deste meu saudoso, carinhoso lar!...

Foi há vinte?... Há trinta?... Nem eu sei já quando!...

Minha velha ama, que me estás fitando,

canta-me cantigas para me eu lembrar!...

Dei a volta ao mundo, dei a volta à vida...

Só achei enganos, decepções, pesar...

Oh, a ingênua alma tão desiludida!...

Minha velha ama, com a voz dorida.

canta-me cantigas de me adormentar!...

Trago de amargura o coração desfeito...

Vê que fundas mágoas no embaciado olhar!

Nunca eu saíra do meu ninho estreito!...

Minha velha ama, que me deste o peito,

canta-me cantigas para me embalar!...

Pôs-me Deus outrora no frouxel do ninho

pedrarias de astros, gemas de luar...

Tudo me roubaram, vê, pelo caminho!...

Minha velha ama, sou um pobrezinho...

Canta-me cantigas de fazer chorar!...

Como antigamente, no regaço amado

(Venho morto, morto!...), deixa-me deitar!

Ai o teu menino como está mudado!

Minha velha ama, como está mudado!

Canta-lhe cantigas de dormir, sonhar!...

Apesar de realista, neste poema Guerra Junqueiro apresenta aspectos de espiritualidade, lembrando o Romantismo e prenunciando características do Simbolismo. Há certo saudosismo da infância e de tempos vindouros.

Realismo: características gerais

Contexto social e histórico do Realismo (1865-1890)
A segunda metade do século XIX é marcada pelo cientificismo (valorização das ciências) e por uma demanda material e ideológica gerada pela Revolução Industrial. Aparecem teorias positivistas que valorizam o progresso e o conhecimento. Com os novos modos de produção, surge uma grande massa de operários explorados e marginalizados, o proletariado.
Assim, um novo cenário social se constrói: a pobreza tornou-se um problema associado à industrialização. Como o número de vagas de trabalho era insuficiente, havia uma grande quantidade de camponeses perdidos nas grandes cidades, vivendo da mendicância.
Os artistas dessa época passaram a adotar uma visão mais objetiva da realidade, por meio do uso da razão.
Em Portugal, a crise se dá no setor agrário. Camponeses, soldados e a pequena burguesia se revoltam. O país é totalmente dependente da Inglaterra e a monarquia encontra-se enfraquecida. Em 1851, por meio de um golpe político, o marechal Saldanha institui a monarquia parlamentarista (nos moldes ingleses) e se inicia o período de Regeneração (1851-1910).
A produção literária
O Realismo tem origem francesa, e inicialmente surge nas artes plásticas, quando Flaubert publica Madame Bovary, um retrato crítico da hipocrisia da sociedade burguesa e romântica. Dez anos depois, Émile Zola publica Thérèse Raquin e dá origem ao extremismo realista, o Naturalismo.
Como vimos, várias teorias deram fundamento ideológico ao Realismo, como o determinismo de Hippolite Taine, o positivismo de Augusto Comte, o socialismo utópico de Proudhon, o evolucionismo de Charles Darwin, entre outras, que serão exploradas quando tratarmos da prosa realista, na qual foram amplamente utilizadas.
Em 1861, o grande poeta Antero de Quental fundou a Sociedade do Raio composta por duzentos estudantes da Universidade de Coimbra propensos a romperem com o convencionalismo acadêmico do Romantismo. Empolgado com as novas ideias revolucionárias, Antero de Quental editou Odes modernas. Essas novidades provocaram a reação do grupo de românticos, encabeçados pelo professor e poeta Antônio Feliciano de Castilho que zombou e criticou os novos poemas numa carta a Pinheiro Chagas, em que ironizava os jovens realistas dizendo que lhes faltava “bom senso e bom gosto”.
Com a resposta de Antero de Quental inicia-se a famosa Questão Coimbrã, considerada o marco literário do Realismo em Portugal. Essa questão consistiu em uma crise acadêmica, na qual diversos textos ofensivos foram trocados. De um lado, os românticos, veteranos e mestres na academia, liderados por Castilho. De outro, os rebeldes estudantes da Sociedade do Raio. Houve inclusive ataques físicos, como o duelo entre Antero de Quental e Ramalho Ortigão.
O Realismo português foi bastante organizado, repleto de encontros e estudos sobre o novo estilo. Nunca a literatura portuguesa havia conseguido alcançar tal feito.
As Conferências Democráticas do Cassino Lisbonense, em 1871, nas quais se discutiam filosofia e literatura, representam a consolidação dos ideais realistas em Portugal. Participaram dessas reuniões o famoso romancista Eça de Queirós e o poeta, folclorista e futuro presidente de Portugal, Teófilo Braga.


Características

O Realismo aparece como uma reação ao Romantismo e se desenvolve a partir da observação da realidade, com uso da razão e da ciência, evidenciando o desenvolvimento científico, que se volta para a valorização da intelectualidade, o que culmina no Cientificismo, como consequência surge o Materialismo em oposição à metafísica, tão valorizada no movimento anterior, o Romantismo.
No Realismo vê-se clara reação contra as excentricidades românticas, como o egocentrismo. Vê-se respeito pela objetividade dos fatos, pelos estudos políticos e sociais, como o Positivismo de Augusto Comte e o Determinismo geográfico e biológico (de Hypolyte Taine). Valoriza-se as ciências exatas e experimentais, como o Evolucionismo, de Charles Darwin, a Dialética, de Hegel, e pelo progresso tecnológico.
O eu perde lugar para a sociedade e existe uma preocupação por descrever, analisar e até criticar a realidade, pois, motivados pelas teorias científicas e filosóficas, os escritores realistas desejavam captar o homem e a sociedade em sua totalidade, isto é, em seu cotidiano massacrante, no amor adúltero, no egoísmo humano e nas diferenças de classes.
Stendhal e Balzac foram os precursores do realismo literário, retratando a sociedade francesa. Balzac olha os indivíduos como representantes de grupos sociais, e esses indivíduos só possuem significado dentro das narrativas se expressarem as vivências e as ideias de seus grupos. Stendhal desenvolve o método analítico de observação psicológica, seus personagens são construídos através de pormenores mínimos.
Gustave Courbet foi um famoso pintor realista francês que se preocupou em retratar cenas do cotidiano, buscando ser fiel à realidade que o cercava. A tela Os quebradores de pedras, abaixo, marca o compromisso de Courbet com a estética realista e com o Realismo, isto é, com o enfrentamento direto da realidade, descartando qualquer tipo de ilusionismo, pois Courbet era simpatizante das posições anarquistas de Proudhon e teve participação decisiva na Comuna de Paris.
Em um artigo de 1857, Le Réalisme, o jornalista francês Jules François Félix Husson Champfleury transferiu os conceitos da pintura de Courbet para a literatura, e no mesmo ano, publicou-se o romance Madame Bovary, de Flaubert, que retrata a burguesia a partir das emoções de uma mulher infeliz da classe média, Ema Bovary.
Ema Bovary sonha com uma vida diferente e excitante, mas decepciona-se com o marido e com a busca por mundo de beleza, colhido nos textos românticos.
Veja a definição que o escritor Eça de Queirós dá de Realismo[1]:
“Que é pois o Realismo? É uma base filosófica para todas as concepções do espírito - uma lei, uma carta, uma guia, um roteiro do pensamento humano na eterna religião do belo, bom e do justo [...]; é a negação da arte pela arte, é a proscrição do enfático e do piegas. É a abolição da retórica considerada como arte de promover a comoção [...]; é a análise com fito na verdade absoluta. Por outro lado, o Realismo é uma reação contra o Romantismo: o Romantismo era a apoteose do sentimento; o Realismo é a anatomia do caráter. É a crítica do homem [...] para condenar o que houver de mau na sociedade.”




[1] QUEIRÓS, Eça In MOISÉS, Massaud. A literatura portuguesa através dos textos. São Paulo: Cultrix, 2006, p.231.

Romantismo


ROMANTISMO (1825 – 1865)

Os alicerces do pensamento romântico surgem na Alemanha, no fim do século XVIII, com um movimento denominado Stum und Drang (tempestade e ímpeto), criado por Johann Gottfried Herder, e exaltava o nacionalismo, a natureza, os sentimentos em detrimento da razão, e as crenças populares, além de valorizar a liberdade de criação.
Mais do que um movimento, o Romantismo predominou em toda Europa na primeira metade do Século XIX se tornando a expressão de um mundo que gira em torno do indivíduo, foi um modo de vida que se espalhou por toda Europa, como podemos ver na citação abaixo, de um dos pensadores da época, que sinteticamente, apreende o pensamento subjetivo e revolucionário do Romantismo.
“Se quisermos defender a liberdade, precisamos negar o mundo exterior.” (Fichte)
Época de transformação cultural, filosófica, artística, científica e histórica. O sistema monárquico absolutista entra em crise dando vez ao liberalismo da burguesia em ascensão, o que faz com que o início do Romantismo esteja ligado à crise do pensamento clássico, caracterizado por uma perspectiva de mundo contrária ao racionalismo, que se identificava com o tradicionalismo aristocrático. Dessa forma, o movimento romântico buscava critérios estéticos que fossem relativos, valorizando assim o conhecimento intuitivo e a rebeldia individual.
Consequência das contradições da Revolução Industrial e da burguesia ascendente, o Romantismo expressa os sentimentos dos descontentes e por isso faz uso de uma linguagem que ponha em evidência o subjetivo, pois a crise da razão servirá de alicerce ao homem romântico para a valorização do sentimento e da passionalidade.
O homem romântico só encontra seu lugar no seu interior, no seu íntimo, pois a subjetividade é atemporal e atópica, pois seu interior não é organizado segundo as normas do mundo fora dele, aí ele está em plena liberdade.
Os autores românticos, portanto, voltam-se para si mesmos, marcando o século XIX com emocionalidade e uma postura moldada a partir do olhar particular e da relativização dos conceitos, contrariando as verdades absolutas do racionalismo.
Segundo diversos pesquisadores, as origens do Romantismo remontam da Inglaterra, Escócia e Alemanha, sendo a França o país responsável por sua disseminação. Entre os grandes escritores românticos, podemos citar Goethe, Victor Hugo e Lord Byron.
Em Portugal, esses são anos de grande crise e atribulação. Em 1808, D. João VI, a família real e boa parte dos intelectuais e comerciantes vêm para o Brasil devido às invasões napoleônicas. Com a saída dos franceses em 1817, inicia-se entre os irmãos D. Miguel e D. Pedro IV (nosso D. Pedro I), a luta pelo poder. Inicialmente, D. Miguel, com uma postura retrógrada, vence essa disputa. Contudo, em 1833, D. Pedro invade Portugal e coloca sua filha, Maria, no poder. A desordem interna é imensa e a situação só se regulariza em 1847, quando se inicia a Regeneração.
Em clima tão confuso, a estética romântica demorou a se estabelecer em Portugal. Assim, somente nos anos tranquilos, após a Regeneração, o movimento pôde se desenvolver.
Em solo português o Romantismo passou por diferentes fases que podem ser vistas dessa maneira:
1º período
Fase de instauração do movimento, na qual ainda observa-se traços neoclássicos.
2º período
Fase de consolidação do Romantismo.
3º período
Fase de transição para o Realismo.

A produção literária

Por pregar a livre expressão das emoções humanas, a estética romântica se colocava contra a postura clássica então vigente. Ou seja, era contra as regras clássicas e a favor da liberdade formal.
O Romantismo é conhecido como a estética da burguesia, pois evidencia o surgimento de um novo público leitor, diverso da aristocracia. Faz-se mister as simplificações estéticas, refletindo a democratização da cultura. É um movimento bastante complexo, com muitas características.
Características

Subjetivismo
A valorização do “eu” é a principal característica romântica.
Idealização
Uso da fantasia e da imaginação.
Escapismo
Fuga da realidade, do cotidiano.
Idealização da mulher
A amada é pura e perfeita, assim como o amor é eterno
Fusão entre o grotesco e o sublime
A uma nova concepção de beleza. Surge o “belo-feio”
Sentimentalismo
Sentimentos como amor e ódio são extremamente exacerbados;
Espiritualismo, religiosidade
Valores medievais cristãos são resgatados
Satanismo
Por outro lado, a obras que valorizam o satânico, o mistério das sombras
Intensidade do amor
A paixão vigora, o amor leva o ser humano à felicidade e à loucura;
Medievalismo
A figura do herói medieval é resgatada. Fuga ao passado e lugares distantes
Libertação formal
Os românticos são contrários às regras clássicas e suas formas rígidas.
Didaticamente, dizemos que o Romantismo se inicia em Portugal em 1825, quando o poeta Almeida Garrett publica o poema Camões, composto de 10 cantos em versos decassílabos brancos. Apesar de conter ainda características clássicas, as regras não são seguidas e o poema tende para uma biografia sentimental, na qual o subjetivismo e a melancolia dão o tom.
No que concerne à poesia, temos uma produção literária mediana, da qual podemos destacar os poetas Almeida Garrett, Soares Passos e João de Deus.


Almeida Garrett

João Baptista da Silva Leitão de Almeida Garrett (1799-1854) nasceu na cidade do Porto. Em 1809, partiu para a ilha Terceira por causa das invasões francesas, onde teve uma formação clássica. Cursou Direito na Universidade de Coimbra, onde aderiu às ideias liberais vigentes. Contrário a D. Miguel, exilou-se na Inglaterra, entrando em contato com a literatura romântica de Byron e Walter Scott.
Foi um grande intelectual e participou das questões políticas de seu país. Publicou várias peças de teatro: Um Auto de Gil Vicente (1838), O alfageme de Santarém (1841), Frei Luís de Sousa (1843), Falar verdade a mentir (1845), entre outras. Publicou os romances Arco de Santana (1845) e Viagens na minha terra (1846), assim como os livros de poemas Flores sem fruto (1845) e Folhas caídas (1853). Morreu em nove de dezembro de 1854, em Lisboa.
Sua obra revela certa ambigüidade, na qual temos de um lado o conservador e de outro o revolucionário. Contudo, seus escritos não apresentam uma ruptura radical com o Arcadismo. Sua poesia possui tom confessional, o que muitas vezes passa a impressão de que o poeta demonstra estar mais interessado em confessar seu amor do que trabalhar esteticamente o poema. O que pode ser corroborado pelo fato de que seu relacionamento com a viscondessa da Luz, Rosa Mara Nontúfar Barreiros, inspira-lhe os poemas de Folhas caídas de dois volumes. O primeiro com 24 poemas e o segundo com 18.
Vejamos o 8º poema, do 1º volume, bastante conhecido:
Este inferno de amar
Este inferno de amar – como eu amo!
Quem mo pôs aqui n’alma… quem foi?
Esta chama que alenta e consome,
Que é vida – e que a vida destrói.
Como é que se veio atear,
Quando – ai se há de ela apagar?
Eu não sei, não me lembra: o passado,
A outra vida que dantes vivi
Era um sonho talvez… foi um sonho.
Em que a paz tão serena a dormi!
Oh! Que doce era aquele sonhar…
Quem me veio, ai de mim! Despertar?
Só me lembra que um dia formoso
Eu passei… Dava o Sol tanta luz!
E os meus olhos que vagos giravam,
Em seus olhos ardentes os pus.
Que fez ela? Eu que fiz? Não o sei;
Mas nessa hora a viver comecei…
Aqui o eu lírico confessa seu amor intenso, deixando-se enlevar pelo sentimentalismo amoroso. Amar é estar no inferno, mas sua amada é sua vida. Há maior liberdade formal e uso de um vocabulário mais simples.

João de Deus

João de Deus é considerado por muitos como o maior poeta romântico português. Nasceu em 1830 em São Bartolomeu, no Algarve. Frequentou o curso de Direito na Universidade de Coimbra e dedicou-se ao jornalismo e à advocacia. Ligado inicialmente ao ultrarromantismo, depressa o abandonou seguindo uma estética muito própria, sendo considerado um pós-romântico. Suas poesias foram reunidas na coletânea Campo de flores, publicada em 1893, incluindo-se nesta duas obras anteriores: Flores do campo e Folhas soltas. Dedicou-se à pedagogia, resultando daí a Cartilha maternal, publicada em 1876 e tendo como fim o ensino da leitura às crianças.
Sua obra apresenta singeleza e extremo lirismo, lembrando-nos as cantigas trovadorescas e a lírica camoniana. Sua linguagem é simples, sem afetações, e de extrema qualidade estética:
Adoração
Vi o teu rosto lindo,
esse rosto sem par;
contemplei-o de longe, mudo e quedo,
como quem volta de áspero degredo
e vê ao ar subindo
o fumo do seu lar!
Vi esse olhar tocante,
de um fluido sem igual;
suave como lâmpada sagrada,
bem-vindo como a luz da madrugada
que rompe ao navegante
depois do temporal!
Vi esse corpo de ave,
que parece que vai
levado como o Sol ou como a Lua,
sem encontrar beleza igual à sua,
majestoso e suave,
que surpreende e atrai!
Atrai, e não me atrevo
a contemplá-lo bem;
porque espalha o teu rosto uma luz santa,
uma luz que me prende e que me encanta
naquele santo enlevo
de um filho em sua mãe!
Tremo, apenas pressinto
tua aparição;
e, se me aproximasse mais, bastava
pôr os olhos nos teus, ajoelhava!
Não é amor que eu sinto,
é uma adoração!
Que as asas providentes
do anjo tutelar
te abriguem sempre à sua sombra pura!
A mim basta-me só esta ventura
de ver que me consentes
olhar de longe... olhar!
Veja como o poema evidencia lirismo e simplicidade. Há seis estrofes de 6 versos (sextilhas), com número de sílabas irregulares, mas constantes. Apresenta paralelismo sintático, como nas cantigas medievais, em contraste com a subjetividade e o amor intenso. O amor é tão imenso que se torna adoração pela mulher, que é idealizada, bela e santa.

O Romantismo no Brasil


Em nossa terra, o Romantismo tem início por volta de 1830, ainda sob a euforia da Independência, em 1822, que agrega um clima de conscientização nacionalista ao cenário nacional, embora esse “nacionalismo” corroborasse com a manutenção do regime monárquico no Brasil, avesso aos ideais republicanos e abolicionistas.
Desde a independência, o país vivia as dissidências entre os federalistas, que lutavam por um governo mais democrático e por maior autonomia das províncias, e os centralistas, que faziam parte da aristocracia e eram imperialistas. Essas dissidências geraram rebeliões contrárias à monarquia e à escravidão, tais como Cabanagem (1833 – 1839) , a Balaiada (1838 – 1841), a Sabinada (1837 – 1838), a Revolução Farroupilha (1835 – 1845) e a República Juliana (1839).

No âmbito literário essas contradições políticas estão representadas pelos escritores regionalistas, que se alinhavam ideologicamente aos federalistas, e pelos escritores que idealizavam uma cultura nacional que se definia de acordo com os padrões românticos importados, e que vai encontrar ecos no Modernismo, como veremos nas unidades III e IV.
Grande parte dos nossos escritores, saída de famílias abastadas do campo, da alta classe média do país, como bem mostra a citação de Antônio Cândido, abaixo, absorveu os padrões românticos europeus, por meio de aspirações de fundar em um passado mítico, a nobreza recente do país, revelando suas ambiguidades e contrapondo a moral do homem antigo à grosseria dos novos ricos, ou a coragem do sertanejo às vilezas do homem citadino.

A Literatura do Brasil faz parte das literaturas do Ocidente da Europa. No tempo da nossa independência, proclamada em 1822, formou-se uma teoria nacionalista que parecia incomodada por este dado evidente e procurou minimizá-lo, acentuando o que haveria de original, de diferente, a ponto de rejeitar o parentesco, como se quisesse descobrir um estado ideal de começo absoluto. Trata-se de atitude compreensível como afirmação política, exprimindo a ânsia por vezes patética de identidade por parte de uma nação recente, que desconfiava do próprio ser e aspirava ao reconhecimento dos outros. Com o passar do tempo foi ficando cada vez mais visível que a nossa é uma literatura modificada pelas condições do Novo Mundo, mas fazendo parte orgânica do conjunto das literaturas ocidentais.
(Cândido, Antônio. Iniciação à literatura brasileira: resumo para principiantes. Introdução. 3. ed.– São Paulo: Humanitas/ FFLCH/USP, 1999.)

 O projeto de literatura nacional


A literatura se fez linguagem de celebração e terno apego, favorecida pelo Romantismo, com apoio na hipérbole e na transformação do exotismo em estado de alma. O nosso céu era mais azul, as nossas flores mais viçosas, a nossa paisagem mais inspiradora que a de outros lugares.
(CANDIDO, Antonio. A educação pela noite & outros ensaios.
Literatura e subdesenvolvimento. São Paulo: Ática, 1989.)

A temática romântica, aqui, ganha nuances próprias, em virtude do clima de nacionalismo, como vemos no texto de Antônio Cândido, no box.
Contribuíram para isso, obras de pintores brasileiros que buscavam valorizar o país, retratando a exuberância da natureza, reinventando o Bom Selvagem ao aproximar o índio do herói medieval, e se apropriando de fatos históricos importantes, contribuindo para a formação de uma identidade nacional, já mencionada anteriormente. Podemos elencar dentre as obras deste período: Rio Panahyba, de Rugendas[1], e Independência ou morte[2], de Pedro Américo, que vemos a seguir.






              
A tabela abaixo[3] mostra um esquema temático das produções românticas no Brasil e suas características e influências.


Produções românticas
Características
Primeiros românticos[4]
Início do movimento que ainda revela preocupação com a estética clássica. Chamado de “romantismo oficial”, tinha apoio do imperador e buscava consolidar o nacionalismo.
Romantismo nacional e popular[5]
Voltam-se para as raízes nacionais e adotam o romance como maior forma de sua expressão.
Ultrarromantismo
Conhecido como individualista e subjetivo, sofreram influência do “mal do século”. Valorizavam o pessimismo e a boemia.
Condoreirismo
Caracteriza-se pela preocupação com as questões políticas e sociais. Influenciados por Vitor Hugo, produziram uma literatura engajada nos ideais republicanos e abolicionistas.

 A Prosa Romântica


A produção romântica em prosa, no Brasil, tem sua estréia com a publicação em folhetim[1] da obra A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo.
O folhetim foi largamente consumido pelo público, ávido por tramas simples e ações heroicas, e dessa forma o gênero romance ganhou o público leitor no Brasil.
O crítico literário Antônio Soares Amora, em A Literatura Brasileira v. II, foi quem primeiro organizou, por temas, os romances românticos brasileiros. A tabela abaixo apresenta sua classificação.

Romances
Características
Romance Histórico
Caracteriza o período de formação da nação brasileira, remetendo-se ao passado colonial.
Romance Urbano
Sua temática está centrada nas tensões amorosas das classes alta e média do Rio de Janeiro.
Romance Indianista
Tem como protagonista o índio que, alçado a herói, recupera a temática do Bom Selvagem de Rousseau, dignificando a ancestralidade do brasileiro.
Romance Regionalista
Ambientados em regiões rurais, distantes da capital do Império, o Rio de Janeiro. Ganha nuance nacionalista à medida que se preocupa com questões sociais.