Carlos Drummond de Andrade (1902-1987)
Nascido numa pequena cidade de Minas
Gerais , Itabira do Mato
Dentro , Carlos Drummond de Andrade tem
uma importante contribuição
para a renovação e para a
consolidação das propostas
iniciais do Modernismo. Em 1920, conhece Oswald de Andrade, Blaise Cendrars, Tarsila do Amaral e Mário de
Andrade, que visitavam Belo Horizonte .
A partir desse contato ,
começa a se corresponder
com Mário de Andrade, mantendo vivo esse hábito durante toda a vida do escritor paulista .
Testemunha
lúcida de si
mesmo e do transcurso
dos homens , de um
ponto de vista
melancólico e cético, enquanto ironiza os costumes
e a sociedade , no que se mostra satírico em seu amargor e desencanto ,
entrega-se à comunicação estética.
Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio de escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.
Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desejo, morto
o pântano sem acordes.
Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso,
anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.
Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desfiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microscopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer
esse amanhecer
mais noite que a noite.
O poeta se revela limitado e impotente diante do mundo ("tenho apenas duas
mãos/ e o sentimento do mundo"), embora "cheio de
escravos".
O poema pode ser entendido, também, como
um poema metalinguístico, isto é, um poema sobre o próprio fazer literário ("minhas lembranças
escorrem"), onde os poemas ("escravos") surgem como armas
("havia uma guerra/ e era necessário/ trazer fogo e alimento")
resultantes do "sentimento do mundo" do qual o poeta se conscientiza
a partir dessa obra.
Sua visão acerca do mundo é extremamente pessimista, como podemos constatar no último verso, com um "amanhecer mais noite que a noite".
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